CAMPUS AMAJARI – Unidade ao norte do estado se reinventa durante ano de pandemia
Em meio ao cenário da pandemia de Covid-19, o serviço público, em especial o de educação, precisou se adequar: trabalho remoto, aulas virtuais e o ensino híbrido são a nova realidade de milhares de servidores e estudantes dos Institutos Federais do Brasil. E o que falar daquelas unidades localizadas em áreas mais remotas? Locais que enfrentam, naturalmente, um isolamento no que diz respeito à distância dos grandes centros, às falhas na conexão de internet e, por diversas vezes, dificuldade com o fornecimento de energia elétrica?
Uma dessas unidades está aqui, no norte do estado. O Campus Amajari do Instituto Federal de Roraima (IFRR-CAM) está localizado a 158 km da Capital e é a unidade roraimense com maior número de estudantes autodeclarados indígenas. Mesmo mantendo cursos técnicos em sua grade, nos quais as aulas práticas fazem parte do ensino, a unidade não deixou de desenvolver atividades virtuais para atender sua comunidade acadêmica durante a pandemia.
EAD – Em outubro de 2020, o CAM certificou 97 novos técnicos em agropecuária, do curso subsequente ao ensino médio na modalidade de Educação a Distância (EAD). Os estudantes, com o ensino médio completo, aproveitaram a oferta do curso em 2018 para ganhar uma formação técnica. As aulas foram transmitidas para sete polos: sede do Amajari (Vila Brasil), Comunidade Indígena Truaru da Cabeceira (Boa Vista), Taiano (Alto Alegre), sede de Normandia, Comunidades Indígenas Raposa e Araçá da Serra (Normandia) e sede do Município do Uiramutã. A cerimônia ocorreu de forma virtual, por meio da plataforma Google Meet.
A oferta de cursos não parou durante o período de isolamento social. Em novembro do ano passado, o CAM deu início ao curso de formação inicial e continuada (FIC) de Piscicultor. Com carga horária de 160 horas, ele foi realizado 100% a distância, superando distâncias geográficas, o curso e atravessando fronteiras territoriais. A comprovação disso é o caso do estudante moçambicano Edio Macamo, que se inscreveu para buscar melhorias no trabalho. Edio conheceu o Campus Amajari em uma visita técnica, no ano de 2019. Ao saber da abertura do curso, decidiu se inscrever. “Inscrevi-me porque tenho uma certa paixão pela piscicultura e vi a oportunidade de melhorar e aprofundar meus conhecimentos sobre o tema, e ter uma relação com mais produtores”, contou.
Para o professor do CAM, Lucas Comassetto, o curso ofertado no formato EAD foi muito propício no momento atual. “Devido à pandemia, muitas pessoas passaram o ano sem ter acesso a capacitações e formações, e esse modelo de curso tem sido muito positivo e atendido à demanda”, disse. Comassetto acredita que o curso vá contribuir para o desenvolvimento da piscicultura no Estado de Roraima. “Há também alunos matriculados que já atuam na piscicultura, mas que ainda não possuem a certificação. Eles viram no curso a oportunidade de conhecer mais sobre a parte técnica do processo produtivo”, concluiu.
PEIXARR – E por falar em piscicultura, o Campus Amajari tem conseguido contribuir para o fortalecimento da piscicultura de base familiar e comunitária em Roraima. Uma das iniciativas é o Peixarr, Programa de Fortalecimento da Piscicultura de Base Familiar e Comunitária no Estado de Roraima, que entregou, só este ano, 9 mil alevinos a piscicultores do Tepequém.
O Peixarr tem como objetivo proporcionar a segurança alimentar das famílias beneficiadas, por meio da distribuição de alevinos e da prestação de serviços gratuitos de Assistência Técnica e Extensão Rural. Desde o início do projeto, já foram entregues mais de 73 mil alevinos a 31 iniciativas de Amajari, Bonfim, Pacaraima, Cantá, Boa Vista e Alto Alegre. A intenção é atingir a marca de 100 mil alevinos entregues, ainda em 2021. Os beneficiados ainda recebem formação do CAM para que tenham autonomia e possam realizar o manejo dos peixes de forma sustentável.
CONQUISTAS – Durante esse período, a equipe do CAM pode testemunhar vitórias dos seus egressos. É o caso do Lucas Barroso Januário, 23 anos, que foi convocado no concurso da Agência de Defesa Agropecuária e Florestal do Estado do Amazonas (Adaf). Morador da Comunidade Indígena Araçá, no Município do Amajari, e o mais novo de nove irmãos, Lucas foi aprovado no concurso de 2018 da Adaf para o cargo de técnico em fiscalização agropecuária. Ele defendeu o trabalho de conclusão de curso como tecnólogo em aquicultura, em dezembro de 2020.
Outra grande conquista foi da egressa do curso Técnico em Agricultura (2015) e da primeira turma do curso superior de Tecnologia em Aquicultura (2019) do CAM, Nalim Lourenço, de 25 anos. Ela foi aprovada em primeiro lugar (polo local) para o mestrado profissional em rede nacional em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos, do Programa de Pós-Graduação ProfÁgua. O programa é ofertado pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) em parceria com universidades associadas pelo País, como a Universidade Federal de Roraima. Da etnia wapichana, Nalim nasceu em Boa Vista, e morou, até os 4 anos, na Comunidade Indígena Araçá, até mudar-se para a sede do Amajari, a Vila Brasil. Ela foi a primeira de sete irmãos a concluir um curso superior e a ingressar numa pós-graduação.
ATIVIDADES EXTRA CLASSE – Para integrar a comunidade acadêmica, o CAM vem oferecendo uma série de eventos/atividades virtuais. Um deles, o Clube do Livro, fruto de uma parceria entre a Coordenação de Assistência Estudantil do CAM e a Comissão Interna de Saúde e Segurança do Servidor Público (Cissp/IFRR), debateu virtualmente diferentes obras, com o objetivo de promover o hábito da leitura e a interação entre os participantes. Foram debatidos os livros O Milagre da Manhã, de Hal Elrod, O Pequeno Príncipe, do francês Antonie de Saint-Exupéry, O Diário de Anne Frank, A Cidade do Sol, de Khaled Hosseini, e Inocência, de Visconde de Taunay.
O CAM também chegou a oferecer aulas virtuais de yoga, atividade que beneficia o corpo e a mente, de forma interligada. As aulas foram ministradas pela professora Luciana Barros e, de acordo com ela, os exercícios ajudam no controle do estresse, da ansiedade e das dores no corpo e na coluna, além de melhorarem o equilíbrio e promoverem a sensação de bem-estar. Eles podem ser praticados por adultos, idosos e crianças.
DIREÇÃO GERAL – Em 2020, o CAM elegeu a primeira mulher indígena para assumir a Direção-Geral da unidade. Foi o segundo processo de escolha de dirigentes do Campus Amajari, implantado por meio da Portaria 1.366, de 6 de dezembro de 2010. Eleita com 63% dos votos, Pierlangela Cunha é natural da Comunidade Indígena Barata, Município de Alto Alegre, e substituiu Sterfson Barros, que dirigiu o campus desde os trabalhos de expansão do antigo Centro Federal de Educação (Cefet) no Amajari, em 2008.
HOJE – Já em 2021, o CAM percorreu mais de 2.500 km para entregar material didático aos seus estudantes, atendendo a localidades e comunidades indígenas de oito dos 15 municípios de Roraima, e beneficiando aproximadamente 250 estudantes dos cursos técnicos e do superior. Na ação, foram entregues cerca de 640 apostilas para atender os estudantes da unidade, o que corresponde a algo em torno de 30 mil cópias. O material incluiu conteúdo das disciplinas básicas (como Português, Matemática e Biologia) e das técnicas (específicas de cada curso, como Olericultura, Nutrição Animal, Topografia, Grandes Culturas e Piscicultura). Além de seguir de carro, o material também seguiu de avião para atender os alunos da etnia yekuana, moradores da Comunidade Kuratanha, na região de Auaris, Terra Indígena Yanomami, no Município do Amajari.
Como de costume, mesmo com a pandemia, a equipe do CAM tem percorrido comunidades afastadas para inscrições itinerantes ou efetivação de matrículas. Na última semana, uma equipe visitou localidades para a realização de matriculas dos aprovados no último processo seletivo para os cursos técnicos integrados ao ensino médio de Agropecuária e Aquicultura. Novos 80 alunos ingressarão na unidade ainda este ano, aderindo à nova realidade provocada pela pandemia. Serão recepcionados de maneira virtual, e terão aulas à distância.